sábado, 15 de setembro de 2012

Santo António, a cidade dos figurantes

    A minha estadia no país nunca estaria completa sem fazer uma visita à ilha do Príncipe, por isso no outro dia apanhei uma mota e lá fui a deslizar em direcção ao aeroporto. Na mochila: barbatanas, máquina fotográfica, livro, roupa, amoque e pouco mais. Detesto viajar com tralha.
    À espera no aeroporto estavam já umas poucas pessoas, todas elas bem carregadas com oferendas para família e vizinhos - ainda que o peso máximo para a bagagem sejam 15kg - mas no fim todos superámos o teste da balança e sentámo-nos à espera que as malas fossem carregadas no avião.

O avião é dos mais pequenos onde já viajei e a bagagem é carregada manualmente ali mesmo à nossa frente.

Vista de dentro do avião - uma fila de cada lado e é preciso baixarmo-nos para não batermos com a cabeça no tecto.

    A viagem correu bem, sem muita turbulência, e trinta e cinco minutos depois já estávamos no Príncipe. O aeroporto é minúsculo e à minha espera estava já o Simon, um biólogo que passou os últimos meses a enlouquecer na ilha enquanto estuda o papagaio-cinzento. Depois de uma boleia rápida, estávamos finalmente na cidade de S. António, a maior no Príncipe.
    Desde o instante em que se põe o pé nesta cidade que se nota algo estranho. "Onde está toda a gente?" A cidade é muito pequena mesmo, e não tem quase ninguém. E as poucas pessoas que cruzam a cidade parecem... falsas? Como se fossem actores pagos para darem vida a uma cidade que de outra forma estaria verdadeiramente vazia... é muito estranho... e a alimentar toda esta estranheza está sem dúvida uma empresa Sul-Africana chamada HBD (acreditem ou não, quer dizer Here Be Dragons...!) que decidiu transformar toda a ilha do Príncipe num Eco Resort todo sustentável. 
Tudo arranjado, sem dúvida, mas onde estão as pessoas?
    Eco-Resort? Soa bem, sim, mas as ideias por trás desta gente parecem um pouco irreais. Só para terem uma ideia, painéis solares serão proibidos porque seriam vistos a partir do céu... e no final não se deverá ver nada a partir do céu. Eles querem reabilitar as estruturas antigas da ilha, empregar os locais, trazer brancos de fora, e com eles imenso equipamento e dinheiro. Esta malta tem dinheiro. Muito dinheiro. Enquanto lá estive, chegou um carregamento novo de fogões, frigoríficos, etc., para o pessoal todo que lá vive, mesmo que ninguém se tivesse dado ao trabalho de ver se os fogões e frigoríficos (com tomadas Sul-Africanas) cabiam nas respectivas cozinhas para onde seriam enviados! E ao que parece, na casa onde eu estava, não havia espaço para o fogão, um monstro preto e eléctrico (numa ilha onde a luz falha todos os dias). Como já disse, é muito estranho... e as pessoas que a HBD trouxe parecem também elas muito estranhas, como se emanassem uma aura de loucura que não consigo muito bem explicar. No final do primeiro dia já estava a dar em doido, por isso nem imagino como será viver e trabalhar sempre com as mesmas pessoas, todos os dias da semana, preso naquela cidade minúscula.

Toda a cidade parece-me um cenário de um filme, onde os figurantes se passeiam pelas ruas.
    Para completar esta minha fantasia de que toda a cidade é uma espécie de Truman Show, os locais ignoram os brancos (talvez por a HBD ter trazido tantos), todo o mercado da cidade é composto por meia dúzia de mesas todas a vender a mesma coisa, ninguém tem troco (para onde raio vão as moedas e as notas pequenas?!) e existe apenas um taxi em toda a cidade... vê-lo é como ver um extraterrestre...



4 comentários:

  1. http://saotomeaminhahistoria.blogspot.com.br/
    Parabéns pelo Blog. Tenho vontade de conhecer São Tomé e Príncipe, mas por enquanto me encanto com informações mostrada pelo blog.Sou Florencio Cassiano. Moro no Brasil, na Bahia. Sou seguidor do Blog. Meu Blog http://cassianoteixeirat.blogspot.com.br/

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  2. Visão negativa de um lugar tão lindo e de pessoas tão agradáveis!

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  3. Visão negativa de um lugar tão lindo e de pessoas tão agradáveis!

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